O Que Os Cavalos Sabem

 
Ela sempre se considerou uma mulher de escolhas certas. De gestos medidos, de paixões contidas sob a pele morena e os cachos rebeldes que caíam sobre os ombros como se recusassem a ser domados. Lúcia tinha trinta e dois anos, um corpo esculpido pelo tempo e pelo desejo — pernas firmes, quadris que dançavam mesmo em silêncio, um andar que não precisava de pressa para chamar atenção. Casada com Rafael há mais de uma década, construíram juntos um amor que respirava liberdade: conversas à luz de velas, jogos de máscaras, toques em lugares impróprios, sussurros que acordavam a noite. Eram cúmplices. Curiosos. Inquietos.
 
Mas havia algo mais — um fio tênue, quase imperceptível, que pulsava sob a superfície daquela intimidade: o desejo de ser vista por outro olhar. Não por traição, mas por transformação. Como se, por um instante, sair de si mesma pudesse devolvê-la ainda mais inteira.
 
O convite surgiu como um acaso. Um fim de semana em um sítio, organizado pela empresa onde Rafael trabalhava. Ele não poderia ir — um contrato urgente, reuniões intermináveis. Mas insistiu que ela fosse. "Vai te fazer bem", disse, com um brilho nos olhos que ela conhecia bem. O brilho da cumplicidade. O brilho do permitido.
 
Lúcia foi. A cunhada, Mariana, a acompanhou, junto com o marido. Chegaram cedo, sob um céu claro e um vento morno que cheirava a terra molhada e capim cortado. O sítio era rústico, mas elegante — paredes de madeira envelhecida, janelas que se abriam para o horizonte, um silêncio que parecia respirar junto com ela.
 
Foi andando sem destino. Os cavalos no estábulo a chamaram. Não por coragem, mas por fascínio. Nunca montara, mas sempre sonhara com o balanço suave, o ritmo do galope, a sensação de liberdade que só um animal pode dar.
 
Foi então que ele apareceu.
 
Henrique. O chefe de Rafael. Homem de mais de cinquenta anos, corpo de quem trabalha com as mãos, voz grave como o som do trovão distante. Não era belo, no sentido convencional. Mas tinha algo — uma presença. Um olhar que não pedia permissão, apenas observava. E, naquele momento, ela se sentiu vista. Não como esposa, não como mulher casada, mas como corpo. Como desejo.
 
— Você parece feita para este lugar — disse ele, enquanto se aproximava.
 
Ela sorriu, sem graça, mas não se afastou. O ar entre eles mudou. Tornou-se espesso, quente. Ele ofereceu um passeio a cavalo. Ela hesitou. Disse que não era apropriado. Que havia limites. Mas seus olhos já tinham dito sim.
 
Subiu na sela atrás dele. O corpo colado ao dele, as pernas envolvendo o mesmo espaço, as mãos segurando sua cintura. O cavalo andava devagar, mas o mundo girava mais rápido. O vento batia em seu rosto, o cheiro dele — couro, suor leve, um toque de madeira e fumaça — entrava em seus pulmões. A cada movimento, sentia o corpo dele pressionar o seu. E, sob a calça, um volume que não fingia discrição.
 
Quando pararam na pequena casa de campo, no meio do pasto, o tempo pareceu parar.
 
Ele a ajudou a descer. Ofereceu água. Ela bebeu, sentindo os olhos dele percorrendo seu pescoço, o decote da blusa, o tremor sutil das mãos. Então, ele se aproximou. Passou os dedos em seus cabelos. E, antes que pudesse pensar, beijou-a.
 
O beijo não foi doce. Foi dominador. Como se ele já soubesse que ela pertencia àquele momento. Ela resistiu por um instante — um instante que durou uma eternidade. Mas o corpo não obedece à razão. Abriu-se. Correspondia. E, quando ele deslizou a blusa por seus ombros, quando seus lábios encontraram a pele dos seios, ela soube: não havia volta.
 
Não usava calcinha. Nunca imaginara que precisaria. E quando ele viu, quando tocou, quando sussurrou palavras que misturavam desejo e posse, ela sentiu o mundo desabar e renascer ao mesmo tempo.
 
Ele era grosso. Diferente. Um corpo que não se moldava ao dela com delicadeza, mas com força. Com exigência. E, pela primeira vez, ela não foi a mulher que cuida, que acalma, que ama com ternura. Foi a mulher que é tomada. Que é dominada. Que grita sem vergonha, que goza com os olhos fechados e a alma aberta.
 
Naquela tarde, foi inaugurada por um desejo que não sabia que tinha. Um desejo de ser outra. De ser ninguém. De ser tudo.
 
Voltou ao quarto. Tomou banho. Deitou. Pensou em Rafael. Em como aquilo poderia destruir tudo. Mas também em como, talvez, pudesse salvá-los.
 
Na noite seguinte, deixou a porta entreaberta.
 
E ele veio.
 
E voltou.
 
E voltou.
 
Até que, semanas depois, Rafael chegou com um convite: Henrique os queria de volta. Disse que Lúcia amava os cavalos. Que deveria voltar para cavalgar.
 
Ela sorriu. Olhou para o marido. E disse:
 
— Lembra daquela conversa? Da fantasia?
 
Ele assentiu, com os olhos brilhando.
 
— Eu já vivi — disse ela. — E agora quero que você veja.
 
Não foi fácil. Rafael ficou tenso quando viu o volume sob o tecido, quando ouviu o chefe dizer, em voz alta, que queria comê-la. Mas, quando Lúcia respondeu que só se ele a fizesse gozar primeiro, o clima mudou. Virou ritual. Virou entrega.
 
Na piscina, sob o sol poente, Henrique a beijou. A tocou. A chupou diante do marido. E, quando a penetrou, Rafael assistiu. Tocou-se. E, pela primeira vez, não foi ciúme. Foi desejo. Foi amor. Foi entrega.
 
Naquela noite, Lúcia permitiu o que nunca imaginara: o ânus, invadido com lentidão cruel, com uma posse que doía e excitava ao mesmo tempo. Rafael quis interromper. Mas Henrique não deixou.
 
— Sente. Olhe. Aprenda — disse.
 
E Rafael sentou. E olhou. E aprendeu.
 
Porque, no fim, não era sobre traição. Era sobre partilha. Sobre desejo que não se esgota, mas se multiplica. Sobre uma mulher que, ao se entregar a outro, se encontrou mais plenamente em si.
 
Hoje, Henrique acredita que a possui. Que ela é sua amante. Mas Lúcia sabe a verdade: ele é apenas um instrumento. Um caminho. Um espelho.
 
Ela é quem conduz. Ela é quem decide. Ela é quem goza.
 
E, quando fecha os olhos, não vê um homem. Vê o poder. A liberdade. O prazer sem culpa.
 
O amor, reinventado.

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